Ela deu dois passos a frente e inclinou a cabeça deparando-se com uma altura que ninguém que não queira abandonar a vida enfrenta. Logo seu corpo a trouxe para o meio do terraço a fim de que ninguém a visse nesse misto de covardia e sinceridade. Sabe que qualquer um a acharia louca, e que se desistisse, seria a única a decepcionar-se por realmente não ser.
Não conseguia enxergar a paisagem, tão pouco escutar os carros e os barulhos da cidade... Só ouvia o som do seu cigarro queimando o papel que seu lábio tragava, empurrando mais fumaça a um pulmão que logo deixaria de fazer o seu trabalho.
Mas faltava alguma coisa, alguma lágrima ainda não tinha caído... E antes disso seus membros se tornaram imóveis a espera de "sabe-se-lá" que constatação que fosse um impulso para a queda.
Juntou as mãos e assoprou ar quente entre os dedos "minhas mãos nunca permaneceram quentes por muito tempo mesmo", pensou.
Fechou os olhos procurando algum feche de luz dentro da sua cegueira, encarou o vento de rosto aberto procurando algum cheiro familiar que a faria mudar de ideia... De repente, o mundo aquietou-se quando seu peito gritou que foi a dúvida que a trouxe até ali, que essa dúvida sempre esteve ali, e que não poderia mais viver pensando se é normal ou não ser ela, do jeito que é, porque nunca pareceu ser...
Instantaneamente seu corpo relaxou como se ouvisse Bach como quando era pequena e nada a atingia estando sozinha. Abriu os braços abraçando a certeza de que não sabe porquê se tornou essa pessoa no terraço do prédio, e que sonhou com o dia em que isso não doeria mais, que sempre sonhou em não precisar de explicação para sua existência...
Foi quando sorriu, e escutou em sua mente uma campainha tocar antes da queda livre... Ela pulou do prédio de vinte andares, abrindo em seu pensamento, a porta para enfim entrar a sua paz.
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